O próprio do ser humano é pensar. Pensa, pois, de dia e de noite. Neste espaço - às vezes nulo - entre dias e noites surgiu a possibilidade de um estendal de documentos. Primeiro, pensados para possível utilização em atividades escolares. Depois, expostos à sensibilidade de qualquer um. Se não vieres de dia, se não vieres de noite, podes vir ao lusco-fusco que é quando o texto, a imagem, o som e o silêncio sustentam a cor do teu olhar.
José Maria Laura
sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025
JOANA VASCONCELOS - The Enchanted Forest
Une célébration des techniques artisanales
Laine crochetée, tissu, ornements, LED, polyester, structure gonflable, microcontrôleurs, alimentation électrique, contreplaqué
Photo Michael Perini / Swire Properties / Courtesy Joana Vasconcelos / © Adagp, Paris 2025
domingo, 9 de fevereiro de 2025
Na Ferreira ... Dias de História
no Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto
Fotografias de um passado cruel a espelharem-se nas nossas vivências quotidianas...
Fotografias - Maria Laura Matos
«Nos 80 anos do fim da II Guerra Mundial e da libertação dos sobreviventes do Holocausto dos campos de concentração, o Grupo de História, juntamente com as suas turmas, relembrou este triste episódio da História, no âmbito do Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. Foi discutido previamente com os alunos este genocídio em massa perpetrado pelo sistema nazi, constituindo, este, um dos maiores crimes contra a Humanidade.»
A Ferreira não esquece!
Graças às professoras Ana Manuel, Mónica Penajóia, Margarida Carapinha e ao professor Tiago Costa!
Gratos!
Vós que viveis tranquilos
Nas vossas casas aquecidas,
Vós que encontrais regressando à noite
Comida quente e rostos amigos:
Considerai se isto é um homem
Quem trabalha na lama
Quem não conhece a paz
Quem luta por meio pão
Quem morre por um sim ou por um não.
Considerai se isto é uma mulher,
Sem cabelo e sem nome
Sem mais força para recordar
Vazios os olhos e frio o regaço
Como uma rã no Inverno.
Meditai que isto aconteceu:
Recomendo-vos estas palavras.
Esculpi-as no vosso coração
Estando em casa, andando pela rua,
Ao deitar-vos e ao levantar-vos;
Repeti-as aos vossos filhos.
Ou que desmorone a vossa casa,
Que a doença vos entrave,
Que os vossos filhos vos virem a cara.
Si c'est un homme
Vous qui vivez en toute quiétude
Bien au chaud dans vos maisons,
Vous qui trouvez le soir en rentrant
La table mise et des visages amis,
Considérez si c'est un homme
Que celui qui peine dans la boue,
Qui ne connaît pas de repos,
Qui se bat pour un quignon de pain,
Qui meurt pour un oui pour un non.
Considérez si c'est une femme
Que celle qui a perdu son nom et ses cheveux
Et jusqu'à la force de se souvenir,
Les yeux vides et le sein froid
Comme une grenouille en hiver.
N'oubliez pas que cela fut,
Non, ne l'oubliez pas :
Gravez ces mots dans votre cœur.
Pensez-y chez vous, dans la rue,
En vous couchant, en vous levant ;
Répétez-les à vos enfants.
Ou que votre maison s'écroule,
Que la maladie vous accable,
Que vos enfants se détournent de vous.
1947
PRIMO LEVI
sábado, 8 de fevereiro de 2025
MARISA LIZ - Mudar a Canção
Marisa Liz
Alex D’Alva
Bárbara Tinoco
Carlão
Cláudia Pascoal
Diogo Piçarra
Iolanda
Luís Trigacheiro
Neyna
Paulo de Carvalho
Sara Correia
Simone de Oliveira
Letra: Marisa Liz, AC Firmino, BATAMATA
Música: Cancioneiro Tradicional, Marisa Liz, BATAMATA
ROBERT DOISNEAU e JOSÉ DE ALMADA NEGREIROS
Le beigneur en vitrine
Paris -1959
A VERDADE
Je ne crois que les histoires dont les témoins se feraient égorger!
Pensées, Pascal
Eu tinha chegado tarde à escola. O mestre quis, por força, saber porquê. E eu tive que dizer: Mestre! quando saí de casa tomei um carro para vir mais depressa, mas, por infelicidade, diante do carro caiu um cavalo com um ataque que durou muito tempo.
O mestre zangou-se comigo: Não minta! diga a verdade!
E eu tive de dizer: Mestre! quando saí de casa... minha mãe tinha um irmão no estrangeiro e, por infelicidade, morreu ontem de repente e nós ficámos de luto carregado.
O mestre ainda se zangou mais comigo: Não minta! diga a verdade!!
E eu tive de dizer: Mestre! quando saí de casa... estava a pensar no irmão de minha mãe que está no estrangeiro há tantos anos, sem escrever. Ora isto ainda é pior do que se ele tivesse morrido de repente porque nós não sabemos se estamos de luto carregado ou não. Então o mestre perdeu a cabeça comigo: Não minta, ouviu? diga a verdade, já lho disse!
Fiquei muito tempo calado. De repente, não sei o que me passou pela cabeça que acreditei que o mestre queria efectivamente que lhe dissesse a verdade. E, criança como eu era, pus todo o peso do corpo em cima das pontas dos pés, e com o coração à solta confessei a verdade: Mestre! antes de chegar à Escola há uma casa que vende bonecas. Na montra estava uma boneca vestida de cor-de-rosa! Mestre! a boneca estava vestida de cor-de-rosa! A boneca tinha a pele de cera. Como as meninas! A boneca tinha tranças caídas. Como as meninas! A boneca tinha os dedos finos. Como as meninas! Mestre! A boneca tinha os dedos finos...
Escrito em 1921
Publicado em Novembro de 1921
Almada Negreiros
A invenção do dia claro, III PARTE
sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025
terça-feira, 4 de fevereiro de 2025
MARIA TERESA HORTA (1937-2025)
Fotografia de ALFREDO CUNHA - AQUI
TEMPO DE LUZES
É um tempo coado
de azevinho
com odores de doce
e de memória
O colo da mãe
em desalinho
a cor da ternura
na demora
É um tempo de luzes
e de linho
com sussurros
de cristal e de romã
Lonjura que nos traz
o som de um sino
onde o sonho se mistura
com a manhã
MORRER DE AMOR
Morrer de amor
ao pé da tua boca
Desfalecer
à pele
do sorriso
Sufocar
de prazer
com o teu corpo
Trocar tudo por ti
se for preciso
VOAMOS
Voamos a lua,
menstruadas
Os homens gritam:
- são as bruxas
As mulheres pensam:
- são os anjos
As crianças dizem:
- são as fadas
AMOR HUMANO
Eu te procurarei
por entre os astros
do meu sobressalto
e tudo parecerá perdido
à minha beira a querer iludir
séculos de engano
ano após ano
Mas nada será mais belo
que o nosso amor humano
RESISTÊNCIA
Ninguém me castra a poesia
se debruça e me põe vendas
censura aquilo que escrevo
nem me assombra os poemas
Ninguém me paga os versos
nem amordaça as palavras
na invenção de voar
por entre o sonho e as letras
nem amordaça as palavras
na invenção de voar
por entre o sonho e as letras
Ninguém me cala na sombra
deitando fogo aos meus livros
me ameaça no medo
ou me destrói e algema
Ninguém me aquieta a escrita
na criação de si mesma
nem assassina a musa
que dentro de mim se inventa
BASTA
Basta.
— digo —
que se faça
do corpo da mulher:
a praça — a casa
a taça
A ÁGUA
Com que se mata
a sede
do vício e da desgraça
que se faça
do corpo da mulher:
a praça — a casa
a taça
A ÁGUA
Com que se mata
a sede
do vício e da desgraça
FIM DE DIA DE UMA OPERÁRIA GRÁVIDA
Sente o peso do filho
na barriga
As costas leva curvadas
Nas pernas vê as varizes
Vê as mãos
que traz inchadas
(A casa! Chegar a casa!)
E vai andando apressada: empurrando o corpo
lento
devorado de cansaço
Com um desespero manso e firme a entrar-lhe
pelos braços
(A casa? Chegar a casa?)
E a cama desalinhada?
E a comida por fazer?
E a louça não lavada?
Na fábrica ficou a máquina
na oficina o ruído
a obra já acabada
Mas ainda falta a casa
Com a sua vida a cumprir: .
varrer
panelas
jantar
E a roupa do marido
toda ainda por lavar
(A casa... Chegar a casa…)
A que horas vai poder
deitar-se para dormir?
Num sono de se esquecer…
A que horas vai poder?
Sente o peso do filho
na barriga
As costas leva curvadas
Nas pernas vê as varizes
Vê as mãos
que traz inchadas
(A casa! Chegar a casa!)
E vai andando apressada: empurrando o corpo
lento
devorado de cansaço
Com um desespero manso e firme a entrar-lhe
pelos braços
(A casa? Chegar a casa?)
E a cama desalinhada?
E a comida por fazer?
E a louça não lavada?
Na fábrica ficou a máquina
na oficina o ruído
a obra já acabada
Mas ainda falta a casa
Com a sua vida a cumprir: .
varrer
panelas
jantar
E a roupa do marido
toda ainda por lavar
(A casa... Chegar a casa…)
A que horas vai poder
deitar-se para dormir?
Num sono de se esquecer…
A que horas vai poder?
ENQUANTO CALAS
Enquanto calas
dobas o medo
que te cresce na fala
E a solidão bordas
a ponto de silêncio
PONTO DE HONRA
Desassossego a paixão
espaço aberto nos meus braços
Insubordino o amor
desobedeço e desfaço
Desassossego a paixão
espaço aberto nos meus braços
Insubordino o amor
desobedeço e desfaço
Desacerto o meu limite
incendeio o tempo todo
Vou traçando o feminino
tomo rasgo e desatino
Contrario o meu destino
digo oposto do que ouço
Evito o que me ensinaram
invento troco disponho
Recuso ser meu avesso
matando aquilo que sonho
Salto ao eixo da quimera
saio voando no gosto
Sou bruxa
Sou feiticeira
Sou poetisa e desato
Escrevo
e cuspo na fogueira
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