quarta-feira, 5 de novembro de 2025

Escola B. António Sérgio - Em jeito de agradecimento

 

Após 37 anos na Ferreira Dias, as minhas últimas semanas letivas cumpriram-se na Escola Básica António Sérgio, sempre no nosso Agrupamento Aqua Alba.

Nestas fotografias fugazes envoltas nas palavras eternas dos poetas, deixo-vos alguns dos espaços que palmilhei com mais intensidade e que me encantaram os passos: recantos apinhados de arte e verdura, acarinhados pela comunidade escolar ao longo de muitos anos. 

Faltam os rostos, os sorrisos, tantos! Seria impossível fixá-los todos... Continuarão a povoar este espaço, partilhando gestos acolhedores com quem chega, palavras amigas com quem permanece e olhares esperançosos com quem parte.

A gentileza e o apoio de todos os que nortearam estes dias acompanhar-me-ão na nova etapa, Dias e Noites. 

Bem hajam! 

Maria Laura Matos

Fotografias - setembro e outubro de 2025


Amigo

Mal nos conhecemos
Inauguramos a palavra amigo!
Amigo é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece.
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
Amigo (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
Amigo é o contrário de inimigo!
Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado.
É a verdade partilhada, praticada.
Amigo é a solidão derrotada!
Amigo é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
Amigo vai ser, é já uma grande festa!

ALEXANDRE O'NEILL


Pelo sonho é que vamos 

Pelo sonho é que vamos,
comovidos e mudos.

Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia a dia.

Chegamos? Não chegamos?
– Partimos. Vamos. Somos.

 SEBASTIÃO DA GAMA


Quando as crianças brincam

Quando as crianças brincam
E eu as oiço brincar,
Qualquer coisa em minha alma
Começa a se alegrar.

E toda aquela infância
Que não tive me vem,
Numa onda de alegria
Que não foi de ninguém.

Se quem fui é enigma,
E quem serei visão,
Quem sou ao menos sinta
Isto no coração.

FERNANDO PESSOA


La rentrée de Poème 

C’est un petit mot 
Tout propre et tout beau 
Qui ne veut ni école 
Ni sac sur le dos. 
Il préfère les flaques d’eau 
Et les feuilles qui volent, 
Il préfère les étoiles 
Et les bateaux à voiles... 
Pourtant les enfants l’aiment 
Le petit Poème, 
Alors, tout propre et tout beau, 
Son sac sur le dos, 
Il court sur les cahiers 
Des petits écoliers. 

CHRISTINE FAYOLLE


Um Poema

Um poema
é a reza dum rosário
imaginário.
Um esquema
dorido.
Um teorema
que se contradiz.
Uma súplica.
Uma esmola.

Dores,
vividas umas, sonhadas outras…
(Inútil destrinçar.)

Um poema
é a pedra duma escola
com palavras a giz
para a gente apagar ou guardar…

SAÚL DIAS

 
Recordo ainda...

Recordo ainda... E nada mais me importa
Aqueles dias de uma luz tão mansa
Que me deixavam, sempre de lembrança,
Algum brinquedo novo à minha porta...

Mas veio um vento de desesperança
Soprando cinzas pela noite morta!
E eu pendurei na galharia torta
Todos os meus brinquedos de criança...

Estrada afora após segui... Mas ai,
Embora idade e senso que aparente,
Não vos iluda o velho que aqui vai:

Eu quero meus brinquedos novamente!
Sou um pobre menino... acreditai...
Que envelheceu, um dia, de repente!...

MÁRIO QUINTANA


Ou isto ou aquilo

Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo …
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

CECÍLIA MEIRELES


Aprender a estudar

Estudar é muito importante, mas pode-se estudar de várias maneiras…
Muitas vezes estudar não é só aprender o que vem nos livros.

Estudar não é só ler nos livros que há nas escolas.
É também aprender a ser livres, sem ideias tolas.
Ler um livro é muito importante, às vezes, urgente.
Mas os livros não são o bastante para a gente ser gente.
É preciso aprender a escrever, mas também a viver, mas
também a sonhar.
É preciso aprender a crescer, aprender a estudar.
Aprender a crescer quer dizer:
aprender a estudar, a conhecer os outros, a ajudar os outros, a viver com os outros.
E quem aprende a viver com os outros aprende sempre a viver bem consigo próprio.
Não merecer um castigo é estudar.
Estar contente consigo é estudar.
Aprender a terra, aprender o trigo e ter um amigo também é estudar.
Estudar também é repartir, também é saber dar o que a gente souber dividir para multiplicar.
Estudar é escrever um ditado sem ninguém nos ditar;
e se um erro nos for apontado é sabê-lo emendar.
É preciso, em vez de um tinteiro, ter uma cabeça que saiba pensar, pois, na escola da vida, primeiro está saber estudar.
Contar todas as papoilas de um trigal é a mais linda conta que se pode fazer.
Dizer apenas música, quando se ouve um pássaro, pode ser a mais bela redacção do mundo…

Estudar é muito
mas pensar é tudo!

JOSÉ ARY DOS SANTOS


Os amigos

Voltar ali onde
A verde rebentação da vaga
A espuma o nevoeiro o horizonte a praia
Guardam intacta a impetuosa
Juventude antiga -
Mas como sem os amigos
Sem a partilha o abraço a comunhão
Respirar o cheiro a alga da maresia
E colher a estrela do mar em minha mão

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN


A infância não é um tempo, não é uma idade, uma colecção de memórias. 
A infância é quando ainda não é demasiado tarde. 
É quando estamos disponíveis para nos surpreendermos, para nos deixarmos encantar. 
Quase tudo se adquire nesse tempo em que aprendemos o próprio sentimento do Tempo.

MIA COUTO


Mon école

Mon école est pleine d'images, 
Pleine de fleurs et d'animaux, 
Mon école est pleine de mots 
Que l'on voit s'échapper des pages, 
Pleine d'avions, de paysages, 
De trains qui glissent tout là-bas 
Où nous attendent les visages 
Des amis qu'on ne connaît pas. 
Mon école est pleine de lettres, 
Pleine de chiffres qui s'en vont 
Grimper du plancher au plafond 
Puis s'envolent par les fenêtres, 
Pleine de jacinthes, d'œillets, 
Pleine de haricots qu'on sème ; 
Ils fleurissent chaque semaine 
Dans un pot et dans nos cahiers. 
Ma classe est pleine de problèmes 
Gentils ou coquins quelquefois, 
De chansons, de poèmes, 
Dont on aime la jolie voix 
Pleine de contes et de rêves, 
Blancs ou rouges, jaunes ou verts, 
De bateaux voguant sur la mer 
Quand une brise les soulève. 

PIERRE GAMARRA  


Pontinho de vista

Eu sou pequeno, me dizem,
e eu fico muito zangado.
Tenho de olhar todo mundo
com o queixo levantado.

Mas, se formiga falasse
e me visse lá do chão,
ia dizer, com certeza:
- Minha nossa, que grandão!

PEDRO BANDEIRA


Le cancre

Il dit non avec la tête
mais il dit oui avec le cœur
il dit oui à ce qu’il aime
il dit non au professeur
il est debout
on le questionne
et tous les problèmes sont posés
soudain le fou rire le prend
et il efface tout
les chiffres et les mots
les dates et les noms
les phrases et les pièges
et malgré les menaces du maître
sous les huées des enfants prodiges
avec des craies de toutes les couleurs
sur le tableau noir du malheur
il dessine le visage du bonheur.

JACQUES PRÉVERT


La blanche école où je vivrai 
N'aura pas de roses rouges 
Mais seulement devant le seuil 
Un bouquet d'enfants qui bougent 
On entendra sous les fenêtres 
Le chant du coq et du roulier; 
Un oiseau naîtra de la plume 
Tremblante au bord de l'encrier 
Tout sera joie! Les têtes blondes 
S'allumeront dans le soleil, 
Et les enfants feront des rondes 
Pour tenter les gamins du ciel. 

RENÉ GUY CADOU


As palavras

São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?

EUGÉNIO DE ANDRADE


A porta

Eu sou feita de madeira
Madeira, matéria morta
Mas não há coisa no mundo
Mais viva do que uma porta.

Eu abro devagarinho
Pra passar o menininho
Eu abro bem com cuidado
Pra passar o namorado
Eu abro bem prazenteira
Pra passar a cozinheira
Eu abro de supetão
Pra passar o capitão

VINICIUS DE MORAES


Nanou

Pour aller à Tombouctou,
Nanou prend la diligence.
À cheval sur mes genoux,
Voyez comme il se balance !

Pour aller chercher des œufs,
Nanou monte à bicyclette.
Dans un tournant dangereux,
Il fabrique une omelette…

Pour aller jusqu’à la lune
Il n’a qu’à se mettre au lit :
À bord d’une libellule,
Le voilà bientôt parti.

Mais pour aller à l’école,
Nanou marche à reculons !
Il faut que je le console
Et lui porte son carton.

LOUIS GUILLAUME


Forma, só forma

Brincarei ainda na infância
lembrando-me agora?
E que recordação
me pensa a esta hora?
o que sou passou
pela minha existência,
tenho uma presença
 mas já lá não estou:
sou também lembrança
de alguém em algum sítio,
onde não alcança
o que, lembrado, sinto.
E aí repousa já
tornado esquecimento
um dia que virá
há muito, muito tempo.

MANUEL ANTÓNIO PINA


Ensinar
é um exercício
de imortalidade.
De alguma forma
continuamos a viver
naqueles cujos olhos
aprenderam a ver o mundo
pela magia da nossa palavra.
O professor, assim, não morre
jamais...

RUBEM ALVES


Mon stylo

Si mon stylo était magique,
Avec des mots en herbe,
J’écrirais des poèmes superbes,
Avec des mots en cage,
J’écrirais des poèmes sauvages.

Si mon stylo était artiste,
Avec les mots les plus bêtes,
J’écrirais des poèmes en fête,
Avec des mots de tous les jours,
J’écrirais des poèmes d’amour.

Mais mon stylo est un farceur
Qui n’en fait qu’à sa tête,
Et mes poèmes, sur mon cœur,
Font des pirouettes.

ROBERT GÉLIS


Processo

As palavras mais simples, mais comuns, 
As de trazer por casa e dar de troco, 
Em língua doutro mundo se convertem: 
Basta que, de sol, os olhos do poeta, 
Rasando, as iluminem. 

JOSÉ SARAMAGO


L'école 

L'école était au bord du monde, 
L'école était au bord du temps. 
Au dedans, c'était plein de rondes ; 
Au dehors, plein de pigeons blancs. 
On y racontait des histoires 
Si merveilleuses qu'aujourd'hui, 
Dès que je commence à y croire, 
Je ne sais plus bien où j'en suis. 
Des fleurs y grimpaient aux fenêtres 
Comme on n'en trouve nulle part, 
Et, dans la cour gonflée de hêtres, 
Il pleuvait de l'or en miroirs. 
Sur les tableaux d'un noir profond, 
Voguaient de grandes majuscules 
Où, de l'aube au soir, nous glissions 
Vers de nouvelles péninsules. 
L'école était au bord du monde, 
L'école était au bord du temps. 
Ah ! que n'y suis-je encor dedans 
Pour voir, au dehors, les colombes. 

MAURICE CARÊME


Écolier dans la lune

À l’école des nuages
On découvre des pays
Où nul n’est jamais parti
Pas même les enfants sages.
Le soleil avec la pluie
L’orage avec l’accalmie
La météorologie
Bouscule le temps
Les visages
Et les couleurs de nos cris
Dans la cour des éclaircies.
Les oiseaux n’ont pas d’histoires
Les arbres n’ont pas d’ennuis
À l’école des nuages
Aucun enfant n’est puni
Les rêves tournent les pages
Aucune leçon ne t’ennuie
C’est l’école des nuages
Elle t’ouvre sur la vie.

ALAIN BOUDET


Há palavras que nos beijam

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

ALEXANDRE O'NEILL


L'école est fermée 

Le tableau s'ennuie ; 
Et les araignées 
Dit-on étudient 
La géométrie 
Pour améliorer 
L'étoile des toiles : 
Toiles d'araignées, 
Bien évidemment. 
L'école est fermée 
Les souris s'instruisent, 
Les papillons lisent 
Les pupitres luisent, 
Ainsi que les bancs. 
L'école est fermée 
Mais si l'on écoute 
Au fond du silence, 
Les enfants sont là 
Qui parlent tout bas 
Et dans la lumière, 
Des grains de poussière, 
Ils revivent toute l'année qui passa, 
Et qui s'en alla …

GEORGES JEAN

O poeta 

Quando um homem se põe a caminhar
deixa um pouco de si pelo caminho.
Vai inteiro ao partir repartido ao chegar.
O resto fica sempre no caminho
quando um homem se põe a caminhar.
Fica sempre no caminho um recordar
fica sempre no caminho um pouco mais
do que tinha ao partir do que tem ao chegar.
Fica um homem que não volta nunca mais
quando um homem se põe a caminhar
Vão-se  os rios sem margem para o mar.
Ai rio da memória: só imagens.
O mais é só um verde recordar
é um ficar (sem as levar) nas verdes margens
quando um homem se põe a caminhar.

MANUEL ALEGRE


L'école 
 
Dans notre ville il y a 
Des tours, des maisons par milliers, 
Du béton, des blocs, des quartiers, 
Et puis mon coeur, mon coeur qui bat 
Tout bas. 
 
Dans mon quartier, il y a 
Des boulevards, des avenues, 
Des places, des ronds-points, des 
rues 
Et puis mon coeur, mon coeur qui bat 
Tout bas. 
 
Dans notre rue il y a 
Des autos, des gens qui s'affolent, 
Un grand magasin, une école, 
Et puis mon coeur, mon coeur qui bat 
Tout bas. 
 
Dans cette école, il y a 
Des oiseaux qui chantent tout le jour 
Dans les marronniers de la cour. 
Mon coeur, mon coeur, mon coeur qui 
bat 
Est là. 

JACQUES CHARPENTREAU




Sem comentários:

Enviar um comentário